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27.Jul - COISAS SIMPLES DO COTIDIANO
COISAS SIMPLES DO COTIDIANO

 


COISAS SIMPLES DO COTIDIANO


Ivete Monteiro de Azevedo


 


 


[...] Cada um de nós compõe a sua história


Cada ser em si


Carrega o dom de ser capaz


De ser feliz


[...]


 


Almir Sater / Renato Teixeira


 


 


Em “Coisas Simples do Cotidiano”, o cronista Rubem Braga, capixaba de Cachoeiro do Itapemirim, nos apresenta cenas e episódios comuns, projetando neles sua percepção real e singela do que verdadeiramente importa – ou deveria importar – na vida.  


Na obra, é possível constatar que o autor não desmerece os sonhos, visto que são eles que movem as pessoas e o mundo. No entanto, mostra que não é o desejo demasiado por conquistas grandiosas o caminho a se seguir.


A simplicidade diária das vivências, trazidas por meio das crônicas, nos faz refletir também sobre nossas vivências nesse mundo tão tecnológico e midiático, já que muitas vezes um smartphone novo ou qualquer outro aparelho é mais apreciado e glamourizado que as pessoas e a natureza. A falta de sensibilidade do olhar, de apreço pelas pessoas, de encantamento pela vida e a aridez das/nas relações tão presentes nesta hipermodernidade nos imobiliza para as afetuosidades.


Nesta obra, o escritor sinaliza, com sua peculiar sutileza, para as riquezas que podem trazer um sentido autêntico para o nosso dia a dia, como as lembranças do cajueiro integrado à infância na casa dos pais, dos lugares por onde passou e viveu, de um pé de milho plantado no jardim, da satisfação por receber em casa um casal de amigos ou desfrutar a beleza de uma planta e tantas outras reminiscências. Ainda que os novos tempos exijam respostas rápidas a todo instante, é sem pressa que Braga nos conduz com seu olhar magistralmente humano pela descoberta do que pode ser especialmente marcante em nossa existência.


A vida tem sido de excessos: das coisas e dos desejos, consequentemente, também, das preocupações. Com isso, muito se perde quando não dispomos de tempo para viver e apreciar a beleza, a natureza e as inúmeras expressões de vida, afinal é na simplicidade da rotina que coisas extraordinárias acontecem. São as miudezas do cotidiano que nos preenchem de amor.


Embora a dinâmica do mundo hipermoderno tenha se mostrado tão agressiva e destruidora, ainda assim é preciso que a vida moderna seja mais satisfatória e apresente mais felicidade.


E como diz os poetas “[...] É preciso amor pra poder pulsar
É preciso paz pra poder sorrir”


A leitura desta obra nos possibilita explorar a poeticidade existente, revelada em cada uma das 17 crônicas, (Um sonho de simplicidade; Nascem varões; Ser mãe; Rita; As meninas; Natal de  Severino de Jesus; São Cosme e São Damião;  A feira; Almoço mineiro;  Buchada de carneiro; Homem no mar; Marinheiro na rua; A visita do casal; Um pé de milho; Cajueiro; Chegou o outono; Despedida), uma vez que elas se constroem a partir da valorização das coisas quase insignificantes, todavia tão edificantes, de modo que o leitor desvele da realidade que antes passava despercebida em seu entorno, já que por vezes tendemos a ignorar a beleza e a importância das pequenas coisas, dos pequenos seres, gestos e tudo o mais que acostumamos desperceber no corre-corre contemporâneo, a leitura portanto nos leva a uma nova percepção da realidade.


Narradas numa linguagem simples e tomando como tema elementos e
seres quase insignificantes, o cronista nos possibilita o desenvolvimento de um olhar singular sobre a realidade e a vida. Em tempos tão caóticos e conturbados, são as pequenas e simples coisas que nos salvam e deixam a vida com tons mais coloridos. Todavia, só se consegue tal percepção quando desaceleramos e olhamos ao nosso redor.


            Se não apreciarmos o básico que acontece no nosso dia a dia, quando chegar o extraordinário não saberemos também apreciar, porque a vida, o amor e a felicidade acontecem nos detalhes todos os dias, sem datas especiais.


 


 








Hipermodernidade é o termo criado pelo filósofo francês Gilles Lipovetsky para delimitar o momento atual da sociedade humana. O termo “hiper” é utilizado em referência a uma exacerbação dos valores criados na Modernidade, atualmente elevados de forma exponencial.










Professora de Língua Portuguesa e Revisora de Texto.


  Doutora em Estudos da Linguagem pela Universidade Federal Fluminense/UFF – Niterói/RJ


 


 


 


Referência


 


BRAGA, RUBEM. Coisas simples do cotidiano. Edição digital. Global Editora. São Paulo, 2014.




 


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